Lamas

(Militares, comandos, invasões)

 

A organização do exército português antigamente não era nada que se parecesse com a actual. Reparem que em Coimbra, por exemplo todos os serviços militares, exceptuando o Quartel General e a Manutenção Militar, funcionavam em Conventos de frades ou freiras.

Fica-se com a impressão de que, se não fosse o «mata-frades» ter expulsado de suas casas aqueles habitantes incómodos, não tínhamos onde albergar os soldados.

Ainda hoje há no activo, na freguesia de Lamas, um Coronel, um Capitão e um Primeiro Sargento.

Porém, já noutros tempos, alguns filhos desta freguesia ocuparam postos honrosos no Exercito Português.

Mais uma vez, recorremos ao Tenente Coronel Belizário Pimenta que, nos seus «subsídios para a história das invasões francesas», se refere a vários chefes militares da nossa região de Miranda do Corvo.

O primeiro é o capitão-mor do Rabaçal, com a data de 29-6-1808, portanto, após o desembarque das forças inglesas na Foz do Mondego. O título do documento diz: «Cópia do ofício do ilustríssimo e ex.mo. sr. Governador de Coimbra, dirigido ao Capitão-Mor do Rabaçal.»

Logo a seguir, com a data de 2-7-1808, é registado num novo ofício do Governador de Coimbra ao Juiz Ordinário de Miranda do Corvo para que tratasse do fornecimento dos mantimentos para a tropa do Capitão-Mor do Zambujal.

As tropas concentraram-se no Campo do Alhal, em Miranda que na  estratégia desse  tempo, se julgava o ponto de resistência mais importante.

Miranda também tinha o seu Capitão-Mor que, era António Pedro de Paiva Manso Freire e Andrade.

Ao mesmo .tempo, havia o Capitão João Rodrigues de Abreu da Tróia.

José Pereira de Paiva Manso, das Meãs tem o posto de Sargento-Mór das ordenanças. Em nota, o nosso Belizário Pimenta informa que a vila de Podentes pertencia à Capitania das Ordenanças de Miranda do Corvo. Ora, na luta que se travou por ocasião da expulsão dos franceses que invadiram Portugal, sob o Comando de Junot, foi preciso substituir o Capitão de Podentes Pedro José Dias por ter mais de setenta anos. Quem ficou a substituí-lo, foi o seu Alferes João Pedro Dias que foi nomeado Capitão-Mor pelo Capitão-Mor de Miranda do Corvo.

Além dos postos de Capitão-Mor e simples Capitão aparecem os postos de Cabo, Alferes, Sargento, Artelheiro, Granadeiro, Sargento-Mor, Engenheiro, sob a dependência do General da Província, Tenente-General Dom António Soares de Noronha.

Próximo de nós, havia as Capitanias-Mores de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos, Chão de Couce, Abiúl, Rabaçal, Lousã, Penela, Poiares e Miranda do Corvo. Em 21 de Janeiro de 1809, foi nomeado um Governador Militar de Miranda que se tornou «muito importante por ser um ponto de encontro das tropas que, evitando Coimbra, vinham de Condeixa e Tomar a Foz de Arouce  e Ponte da Mucela.

O escolhido foi o Coronel de milícias da Lousã, Luís de Magalhães Mexia.

Do Auto da Câmara de Miranda, mandado fazer pelo Inspector, nomeado pelo General da Província, consta que propuseram, para Sargento-Mor, José Joaquim Cabral Arnau...

No escrito cujas informações se vêm reproduzindo, vemos a assinatura deste Sargento-Mor que foi, sem dúvida, o primeiro a assinar-se — Arnaut — à francesa.

Continuando a falar do Auto, acima referido, propõe-se para a Terceira Companhia de Lamas que, sendo o Capitão José Joaquim Monteiro incapaz do (ou para o) serviço, seja nomeado em seu lugar José Fernandes, de Fervenças, em segundo lugar o Doutor Vicente José de Carvalho, em terceiro lugar, Manuel Ferreira, de Pousafoles — Alferes, Francisco Rodrigues das Neves, capaz, — Sargento de número vago, propõem, em primeiro lugar, António Pedro Lobato, de Fervenças, e depois Pedro Fernandes, de Pousafoles.

Já se falou bastante em Sebastião Alves Nunes de Sousa Andrade e Ataíde, de Chão de Lamas. Mas não se disse que ele foi Capitão das Ordenanças da Ordem de Malta na Comenda de Ansemil e Cadete da Infantaria 16.

Foi muito perseguido, chegando a ser enviado, ao seu encontro, um oficial para o prender...

Estas perseguições, do Morgado de Chão de Lamas, culminaram com a doação que ele tez do seu título nobiliárquico a um Paiva Manso. Ausentou-se e nunca mais nele se falou.

Várias vezes aparece menção do Capitão-Mor António Pedro de Paiva Manso Freire e Andrade.

Este apelido «Freire e Andrade» lembrou-me sempre que ele fosse parente do General Gomes Freire de Andrade que o Marechal Beresford, então à frente da Regência do Governo de Portugal, mandou enforcar com mais onze dos seus partidários, como traidores, em 15 de Outubro de 1817.

Aqueles desentendimentos entre os que dirigiam o nosso Concelho, não são mais que o eco da luta subterrânea entre as lojas maçónicas de obediência francesa e inglesa.

É a clara conclusão a que se chega, lendo a obra recente do alemão Paul Sievertz —A verdadeira história da guerra civil.

Faço esta referência porque sempre me tinham ensinado que fora Dom Miguel de Bragança, no seu efémero reinado, que mandara executar Gomes Freire. Nada mais falso (pois que a execução foi em 1817 e a família real só embarcou no Rio de Janeiro para regressar a Portugal, em 25 de Abril de 1821.

Alguns fazem a história não conforme a verdade, mas de harmonia com as suas paixões.

“Mirante”, Ano 10º, nº 109, 1 abr.1987, f. 3