Lamas

(Capela e imagens)

Não se admirem de que, mais uma vez, trate de mo­tivos religiosos. Não fica mal a um padre.

Quando se talou da igreja, não deviam esquecer as ca­pelas e imagem da freguesia. É do que vamos tratar.

A primeira capela foi fun­dada, sem dúvida, no lugar de Lamas, ao cimo do Vale Crucifício, para guardar um crucifixo, todo em pedra, (monolito) com cerca de 0,80 de altura.

Foi encontrado quando lavravam na fazenda adja­cente. Diz a tradição que, na altura em que o bico do arado lhe tocou, os bois não puxaram mais enquanto o não desenterraram.

É uma relíquia dos cristãos que o esconderam ali quando fugiram dos mouros, na invasão de 711.

Lembro-me muito bem de as procissões, antes de 1940, darem a volta a essa capela para regressar à igreja.

A segunda capela, em anti­guidade, deve ser a de Urzelhe. Pode afirmar-se que já existia, antes de Lamas se tornar independente de Mi­randa.

Ouvi contar a testemunhas de vista que era uma das capelas aonde vinham as La­dainhas da igreja de São Salvador, mesmo depois de Lamas se ter separado de Miranda.

São dignas de nota as ima­gens em pedra, de cerca de 0,80 de altura, da Senhora da Ajuda (Padroeira) e de São Sebastião. Devem ser seiscentistas.

Não se esqueça a capela da Senhora do Desterro que ficava na encosta por onde se descia da Cervejota para o Pisao, que os franceses in­cendiaram na sua fuga cm 1811. Tenho, em meu poder a cabeça, em pedra, do Me­nino que a Senhora tinha ao colo.

No Solar da Azenha tam­bém havia uma capelinha, dedicada à Senhora das Ne­ves.

A última dona levou cer­tamente a imagem para Montessão (S. Martinho do Bispo) onde morreu, embora fosse sepultada no cemitério de Lamas.

É bom lembrar que na Azenha houve um padre há cerca de 200 anos. Chamava-se António do Vale e foi coadjutor de Podentes.

É agora a vez de falar da capela da Senhora da Me­mória, no Vale de Lamas. Mas citemos Nogueira Gon­çalves, no Inventário Artís­tico do Distrito de Coimbra:

“Capela particular. Retá­bulo de madeira entalhada, despintado, da segunda me­tade do século XVI. Tem a Senhora da Memória, seis­centista, acompanhada de duas outras esculturas, com indumentária de freiras. No solo a campa do fundador: Sepultura de António Dias de Cadaixo que mandou fa­zer esta capela, à sua custa, e nela se mandou enterrar 1679”.

Foi em tempos idos, cen­tro de romarias.

No livro do Tombo de La­mas, lê-se: !Na noite de 27 para 28 de Fevereiro de 1972(sic), ardeu completamentc a capela de N.ª Senhora da Me­mória do Vale de Lamas, fi­cando só as paredes e a porta de entrada”.

Eu pensava que, quem vendesse ou destruísse ima­gens ou outros objectos in­ventariados no Inventário Artístico, podia e devia ser castigado em razão de pode­rem ser considerados te­souro da Nação... Digo isto por terem desaparecido an­tes do incêndio, as duas fi­guras que ladeavam a ima­gem da Senhora da Memória.

O dito Inventário também enumera na igreja matriz: “Trindade de pedra de Ançã, da transição dos séculos XVI-XVII”.

Venderam-na! Estou certo de que primitivamente era da igreja de Miranda.

Também, venderam antes de serem inventariadas as antigas imagens de Santo Antão e de D. Zacarias com o filho João Baptista. Conhecia-se por causa da bandeirinha em que se lia: “Ecce agnus Dei”.

Dizem que a imagem da Senhora do Rosário não teve a mesma sorte por ser muito pesada. Dela diz Nogueira Gonçalves: “é de pedra, do século XVI, renascentista, representando a Virgem com o Menino, o qual brinca com uma ave”.

E que é feito da rica Cruz paroquial, de prata, ex-voto do almocreve que vindo de Coimbra, com os bolsos cheios de dinheiro se viu ameaçado de ser assaltado, não longe de Chão de La­mas, no tempo do João Brandão e José do Telhado? Prometeu-a à igreja cuja primeira torre avistasse. A de Lamas é que teve essa sorte.

Ouvi dizer, muita vez que D. Sara, esposa do Lente Dr. Eusébio Tamagnini, mandou fazer dela um ser­viço de chá!

“Mirante”, Ano 7º, nº 80, 1 nov. 1984, f. 1, 2

 

Lamas

(Capelas e imagens)

Quando as famílias eram mais Cristãs que hoje, não se contentavam com um lugar de Culto, a igreja paroquial. Os ricos, em regra edificavam um peque­no Templo que fazia parte do seu solar. Alguns até possuíam o seu Capelão privativo como os Paiva Manso de Tróia. Em 22/11/ 784 foi baptizado um menino chamado Salvador de Pousafoles, pelo Padre Pedro José, "assistente no lugar de Troya em Casa do Capitam mór".

Muitos destes pequenos templos tornaram-se em igreja mãe ou matriz da freguesia em formação. Foi esta a razão que deu a certos fidalgos o direito de assistir aos actos religiosos da paróquia, numa tribuna privada, como ainda hoje se vê por exemplo, na igreja matriz de Condeixa-a-Nova.

À medida que os aglome­rados populacionais aumen­tavam, foram surgindo as Capelas, como filhas da igreja matriz. Tanto a Capela de Fervenças como a de Chã de Lamas (conforme o povo pronuncia e se escrevia em tempos não muito recuados) eram pertença da Casa brasonada da povoação.

Já se notou que Ferven­ças foi maior que Pousafoles. Não podia, pois, deixar de ter a sua Capela. É dedicada a São Miguel Arcanjo, como a igreja principal de Penela. De certo a imagem primitiva levou sumiço. A acompa­nhar o Padroeiro vê-se uma pequena e antiga imagem de São Jerónimo com 0,40 de altura.

Em 16/12/1779 houve em Fervenças o baptizado dum filho de Pedro José Lobato Coelho e sua mulher Angéli­ca Maria Rosa, neto paterno de José Carlos Lobato Coe­lho natural da Lousã, e de Angela Maria Lobatta de Fervenças e materno do Sargento Mór Marcello An­tónio Lobatto e Francisca Maria de Fervenças.

A solenidade destes no­mes mostra que, há 200 anos, ainda corria sangue azul em Fervenças. Convém notar que nesse baptizado tocou, como procurador dum dos padrinhos "o Padre Joam Rodrigues do lugar de Fervenças".

— A Capela de Chão de Lamas é dedicada à Senhora do Socorro. É uma linda imagem de madeira com cerca de 0,80 de altura. Deve ser seiscentista. Foi pena qualquer pintor popular ter-lhe desfeiado o rosto com manchas de tinta, sem gos­to.

O único brasão que resta na freguesia, está no solar do morgado de Chão de Lamas - Sebastião Alves Nunes de Sousa Andrade e Ataíde. Conta-nos Belizário Pjmenta que viu documen­tos em que o velho morgado cedeu a Sérvulo Maria de Paiva Manso Sárrea de Car­valho os seus direitos em 1821. Ainda hoje a capela da Senhora do Socorro é das mais bem arranjadas.

Nascidos em Chão de Lamas, aparecem, na primei­ra metade de 1700, os Pa­dres Domingos Rodrigues, Manuel das Neves e Dr. Manuel Esteves de Carvalho que foi o primeiro que se designou Vigário de Lamas enquanto os outros se assi­navam sempre Cura...

— Na Acta de 10/11/867 da Junta de Freguesia, diz-se que a Junta reuniu junto da Capela da Senhora do So­corro "por virem à Capela referida e não haver missa na igreja". Fez-se a praça duma reparação na Capela de Santo António das Cerdeiras.

Portanto, a Capela já exis­tia.

No dia da festa, organiza­va-se no rocio um Cortejo, cantando-se as Ladainhas dos Santos até à Capela. Na última festa, esse Cortejo seguiu da Capela no fim da Missa, até ao rocio para se benzerem umas "Alminhas" erguidas em memória do fogo apocalíptico que ia destruindo a freguesia em 1983.

Ainda continuam esses pequenos monumentos das Almas do Purgatório — nos Carvalhos (Casais), 1848, da Azenha com belos azulejos do Século XVIII, no adro da igreja, na Carreira e nas Cabeças (Pousafoles) e ago­ra em Urzelhe em memória do desastre que vitimou o José Bento Sequeira, com 33 anos na madrugada de 22/11 979.

Há 200 anos houve nas Cerdeiras o Padre Filipe Seco e foram também lá nascidos os Doutores André Miranda, Francisco Rodri­gues Martins já falecidos, e Aurélio Pereira Carvalho Lopes que Deus conserve por muitos anos.

— Na Acta da Junta de 31/12/1865, aparece António Fernandes Falcão a requerer que, tendo vendido um pe­queno cerrado a Joaquim Francisco Serrano detrás da Capela de São Sebastião de Pousafoles, este fez uma casa, ocupando parte do terreno do adro da dita Capela que fora em tempo destinado para Capela-Mor "de uma Igreja" (sic).

É bom, porém notar que no alto da fachada principal, enfeitada com duas belas pirâmides, representando archotes acesos, aparece a era de 1786. Todavia antes dessa data, já existira uma pequena Capela.

A imagem mais notável é a da Senhora da Maternida­de, de pedra, com cerca de 0,70 de altura, seiscentista. Consta que vem de algum solar ou Convento de Coim­bra, na derrocada de 1834.

São também bem dignas de nota as duas telas que ladeiam o altar, representan­do uma o Apóstolo S. Pedro e outra S. Paulo.

Tem torre com relógio e dois sinos. Avista-se do Castelo de Penela.

Falta mencionar a Capela dos Casais de São Clemen­te. Não se sabe nada da origem da Capelinha primiti­va que tinha à frente um alpendre. Foi restaurada em 1903 conforme se vê no livro das contas e na porta prin­cipal. Para a sua restauração muito contribuiu José Fer­nandes Martins, há pouco falecido nas Lages (Coim­bra), que conseguiu uma grande fortuna no Brasil e era deste lugar. Tem Capela mór, arco cruzeiro, coro, Torre edificada em 1952, com relógio que bate horas e meias horas, num único sino.

A imagem do Padroeiro, gótica, com perto de um metro, de pedra, quinhentis­ta, está revestida com para­mentos pontificais, triregnum (mitra com 3 coroas) e báculo. Ainda escaparam quatro castiçais de estanho de meio metro. mas o Cruci­fixo já voou.

“Mirante”, Ano 7º, nº 81, 1 dez. 1984, f. 1, 3