Lamas

(António Francisco “O Garavanço”)

 

Fiei-me na memória, escrevendo que no célebre manuscrito de 1750, já se falava no apelido «Arnaut».

Errei.

De facto, a informação diz assim:

«No lugar de Vila Nova vive uma senhora viúva sem descendência chamada Dona Rosa M.ª Pimentel Arnao, filha de Ignácío Arnao já defunto que viveu no mesmo lugar e era fidalgo da Casa Real».

A mesma informação, ao enumerar os padres que havia na freguesia de Alvares, cita o «P.e José António Arnao 3ó anos — Vila».

Vê-se portanto que já naquela época, havia Arnáus lá na serra.

Hoje queria lembrar os grabanços ou garavanços.

Fiquei surpreendido ao ler, há dias na vida de Cristo de Perez de Urbel, a seguinte frase: «tem o garavanço nas mãos para limpar a eira e, depois de ter padejado etc».

Sempre tinha havido aquela frase: «tem na sua mão a pá de joeirar para limpar a sua eira e recolher o trigo no seu celeiro, etc».

Agora, em vez de pá, aparece garavanço...

Pensei que fosse uma palavra espanhola. Mas não. Vem no nosso dicionário do povo: Garavanço, S. M. forcado de limpar o trigo.

Forcado ou pá, no caso, é a mesma coisa por desempenhar a mesma função dum instrumento, empregado nas eiras, para separar a palha e a moinha do grão.

Mas aquela .palavra só a conheça para dar outro nome ao grão de bico e a uma família que havia, em Urzelhe, na minha infância.

Esta família vivia «além do rio» e era constituída ,pela «gravança velha», a Maria Gravança ou «gravança nova» e o oficial da tropa «gravanço».

A Maria Gravança casou com J. S. Tremoço de quem nasceu três filhos, ainda felizmente vivos: o Alberto, no Corvo, o Adail em Urzelhe e o Manuel em Albarrol

A alcunha «Gravanço», esque­ceu e já ninguém a usa.

A Gravança velha fora casada com Jerónimo Francisco e veio fixar-se em Urzelhe com os filhos nascidos e baptizados noutra freguesia.

Além da garavança nova, já referida, teve um filho, muito simpático, que aparecia todos os anos, na .minha infância, a passar uns dias de férias.

Chamava-se António Francisco «o gravanço».

Não sei se foi na batalha de La Lis que ele foi promovido a sargento, como aconteceu ao célebre «milhões» de Trás dos Montes e ao pai de um amigo meu da Bendafé. O caso é que tendo escolhido a vida militar para sua profissão, subiu na hierarquia militar até se aposentar no posto de capitão.

Tinha habilidade especial para a instrução dos recrutas.

Quando começou a ter «impedido» todos gostavam muito de estar ao seu serviço.

Ainda hoje se fala, com gratidão, da amizade com que ele tratava os rapazes da freguesia e da vizinhança, como Podentes, por exemplo.

Tinha família numerosa e... tudo o vento levou!

Morreu já certamente e a família perdeu o contacto com a freguesia de Lamas.

Já que não conseguimos saber onde se guardam as suas cinzas, que fique aqui no «Mirante» gravado a memória do capitão Garavanço.

“Mirante”, Ano 9º, nº 108, 1 mar.1987, f. 5